O valor do título Mãe de Deus
- Alan Dionizio (catequista leigo católico)
- 7 de dez. de 2016
- 5 min de leitura

“Maria – Filho amado, minha glória só consistia em imitar Jesus. Ora, durante muito tempo em que viveu no mundo, Jesus não mais quis ser que “um Deus oculto” (Is 45,15).” (Livro Imitação de Maria).
II. Porém, qual o significado, o valor do título Mãe de Deus?
1. A grandeza da Mulher
Título maior que o de Maria na história da Salvação dado a um ser humano não há. Portanto, a pessoa que chegou ao grau supremo de realização humana não é do gênero masculino, mas sim do gênero feminino. Uma mulher, sinônimo de fragilidade e fraqueza: mulheres pobres, corpos sofridos e ungidos por gestos de vida e de luta.
É essa humildade e garra, próprias do ser mulher que permite a graça acontecer em Maria, como diz 2 Cor 12,9:” Basta-te minha graça, porque é na fraqueza que se revela totalmente a minha força. Portanto, prefiro gloriar-me das minhas fraquezas, para que habite em mim a força de Cristo.”.

2. A Mulher é Porta na História da Salvação
É preciso recordar também que Maria está no centro da história da Salvação e que a Graça para vir ao mundo espera seu consentimento (Lc 1, 38), também, desde o ventre, a Graça é conduzida e comunicada por Maria (Lc 1, 41). E para quem sabe receber uma pequena graça, sabe que ela não passa, pois uma vez concedida, é para sempre. Assim, Maria faz história permitindo que a Graça venha ao mundo e, como a graça não cessa, como diz Fr. Clodovis Boff, “É FAZENDO GRAÇA QUE A MÃE DE DEUS FAZ HISTÓRIA”.
3. Maria faz história escutando o coração de um povo
Não se é possível esquecer que no 'sim' de Maria e no seu canto do Magnificat, Maria dá voz a todo um povo que clama por Deus e que guarda a esperança de seu agir, de sua libertação. Maria compreende que quem há de nascer de seu ventre é o Salvador esperado. Ela não diz seu sim apenas por si mesma, mas em cumprimento dessa esperança de um povo sofrido.
Tanto antes como agora, Maria faz história escutando o coração de um povo que clamava e que continua clamando a presença de um Deus em sua história, capaz de se compadecer e lhes dar a salvação. E é nesse sentido, que o título Mãe de Deus ecoa até nós, hoje, na devoção, e faz história, realiza-se na nossa vida. Nossa Senhora é professora e livre docente em matéria de graça e de história, se plugou?

Vejamos um exemplo: pedimos uma graça a Deus pelas mãos de Maria; quando a alcançamos, tratamos de agradecer logo a Deus e a Maria, porque cremos que sem a intercessão dela, Deus demoraria em atender nosso pedido; assim, a graça alcançada é uma benção nos fatos da nossa história que não foi alcançada pelo mérito de nossa fé, mas pela força incessantemente humilde de Maria e, aí foi Maria que me permitiu ter esta graça. Ela fez história em minha vida, fez Deus acontecer.
4. Deus quis ter uma Mãe
Quer dizer que Deus faz tudo que Maria quer porque Ele lhe é subserviente? Jamais. Deus, na história superou infinitamente, em humildade, Maria: Ele quis ser filho, quis uma mãe e, através dela, experimentar concreta e primeiramente o amor humano; assumiu todos os deveres de filho, de um filho amoroso e obediente.
Explica S. Luís Montfort: “Pois que a graça aperfeiçoa a natureza e a glória aperfeiçoa a graça, é certo que Nosso Senhor continua a ser, no céu, tão Filho de Maria, como o foi na terra. Por conseguinte, ele conserva a submissão e obediência do mais perfeito dos filhos para com a melhor das mães. (p.32)”. Como obediência se entenda zelo, ternura e atenção aos cuidados e recomendações de sua Mãe cujo pedido é tão humilde e singelo que é sempre terno e comovente para Deus.

E por que Maria intercede e interfere em nossa história? Porque é pessoa viva e sobretudo porque é Mãe, que como tal, se preocupa com a sorte de seus filhos e filhas, sempre acredita neles e, conhecendo seus corações, sua misericórdia atesta que tudo pode mudar. Mãe amorosa quer ser nosso auxílio, pois foi esta a tarefa que recebeu junto à Cruz de Cristo (Cf. Jo 19, 26).

Sto. Afonso de Ligório explica isto, de maneira poética, que “consistindo o reino de Deus na justiça e na misericórdia, o Senhor dividiu: o reinado da justiça reservou para si, e o reinado da misericórdia o cedeu a Maria (p.37).” E continua Sto. Afonso: [...] Maria abre o oceano imenso da misericórdia de Deus a quem quer, quando quer, e como quer. Pelo que não há pecador, nem maior de todos, que se perca, se Maria o protege” (p.39).
5. Somos capazes de gerar Deus na História
Então, o que a Mãe de Deus nos ensina por seu título: que o ser humano é capaz de ser parceiro de Deus, ser seu interlocutor e aliado vivo e, assim, mostra a potencialidade divina do ser humano. E mais, ela ensina do que os pobres e humildes são capazes de fazer não apenas pela fé, mas pelo amor: gerar Deus verdadeiramente na história (“Estar circuncidado ou incircunciso de nada vale em Cristo Jesus, mas sim a fé que opera pela caridade”. Gl 5,6).
Resta-nos uma última indagação aqui: como Maria nos ensina a gerar Deus? Como a humanidade pode gerar Deus?
Essa pergunta foi feita pelo próprio Cristo em Mc 3, 33-35, de modo que Jesus respondeu: “Aquele que faz a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe.”. Por isso, Fr. Clodovis Boff inverte o versículo e explica que, através do amor/caridade: “à medida que ‘faz a vontade de Deus’, a humanidade se faz ‘Mãe de Deus’, em breve, a humanidade ‘faz Deus’”.

Assim, é preciso fazer o exercício diário de Maria de ENCARNAR a Palavra de Deus e Gerar a vida. Convém combinar aqui duas passagens bíblicas Jo 1, 14 (“E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos sua glória, a glória que o Filho único recebe do seu Pai, cheio de graça e de verdade.”) e Lc 2, 19 (“Maria conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração.”).
O que Maria alcançou em Graça e em Mistério de Amor, somos convidados e desafiados a realizar em ação. Como diz S. Francisco de Assis: “Somos Mães (de Cristo) quando o levamos em nosso coração e em nosso corpo por virtude do amor divino e de uma pura e sincera consciência; nós o geramos por uma vida santa, que deve brilhar como exemplo para os outros.”
A partir do título de Mãe de Deus decorrem todas as outras devoções de Maria. Devoções estas que nos falam mais da beleza de Cristo que dela mesma. Por este título também reconhecemos a santidade e a glória de Maria junto ao povo, pois se o povo de Deus invoca a Mãe de Deus é porque acredita que esteja viva, junto do Altíssimo, pronta a interceder pelos seus.

Peço desculpas pelo longo texto, mas falar de pessoas grandes é difícil em poucas palavras, ressaltando que, muitas palavras, deixei a cargo dos santos e doutores.
Resumo nossa catequese sobre Maria, Mãe de Deus com as palavras de S. Luís Maria Montfort, em seu “Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem”:
“Deus Pai ajuntou todas as águas e denominou-as mar; reuniu todas as suas graças e chamou-as Maria.
Este Grande Deus tem um tesouro, um depósito riquíssimo, onde encerrou tudo que há de belo, brilhante, raro e precioso, até seu próprio Filho; e este tesouro imenso é Maria, que os anjos chamam o tesouro do Senhor, e de cuja plenitude os homens se enriquecem.” (S. Luís Maria Montfort).
Referências:
BOFF, Fr. Clodovis. Maria no Novo Testamento. In.: Congresso Mariano: “Contemplar Cristo com os Olhos de Maria”. João Pessoa: Arquidiocese da Paraíba, 2003.
BOFF, Fr. Clodovis. Mariologia Social: o significado da Virgem para a Sociedade. São Paulo: Paulus, 2009.
CANTALAMESSA, Raniero. Maria: um espelho para a Igreja. São Paulo: Santuário, 2008.
KRIEGER, Dom Murilo S.R. Com Maria, a Mãe de Jesus. São Paulo: Paulinas, 2002.
LIGÓRIO, Santo Afonso. Glórias de Maria. São Paulo: Santuário, 2001.
MONTFORT, São Luís Maria Grinion de. Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem. São Paulo: Vozes, 2008.
Comments