Nossa Senhora, Porta do Céu (parte 01)
- Alan Dionizio (catequista leigo católico)
- 8 de dez. de 2016
- 5 min de leitura
“Vem e te mostrarei a noiva, a esposa do Cordeiro” (Ap 21, 9).
Nestes cinco encontros do mini-curso de Introdução à Mariologia, propusemos uma reflexão geral sobre os ensinamentos que a devoção e a catequese mariana nos ensinam sobre o mistério de Deus e de Jesus Cristo, sem esquecer o valor do grande sinal (Ap 12,1) que é esta mulher para nós cristãos e para a Igreja, ou seja, procuramos mostrar como Maria nos ensina a ser cristãos.
Contudo, resta-nos, ainda, conversar sobre o dogma da Assunção de Nossa Senhora. Particularmente, acho uma verdade muito carinhosa de Deus para com Maria.
I. A assunção de Maria
Feliz daquela que acreditou... Lc 1,45
Uma mulher revestida de Sol (Ap 12,1)

Para falar desse dogma, é oportuno começar pela liturgia. Antigamente a festa da Assunção, celebrada em 15 de agosto, era conhecida por festa da dormição de Nossa Senhora. O que isto quer dizer? Bem, a tradição comemorava e acredita que Maria, mãe de Jesus, não sofrera a corrupção da morte: chegando nos seus últimos momentos de vida “natural”, ela entrou num sono profundo e, em seguida, no tempo em que falece, é ressuscitada em corpo e alma, e levada por anjos ao céu. Ao despertar, vê-se ao lado de seu Filho, no céu. Por isso, diz-se que Maria não sente a dor da morte nesse momento: é como se a morte não existisse para ela. Foi mais ou menos assim que me contaram.
É fato que os textos bíblicos não relatam a vida de Maria após Pentecostes, nem tampouco quando e como ocorreu sua Assunção, porquanto esta verdade não parte de um relato histórico como o temos na ressurreição de Cristo. Este evento da assunção de Maria é puro e próprio da fé devido à unidade de Maria com seu filho Jesus Cristo (CANTALAMESSA, 2008).
“Também no tempo de Pentecostes, a vida de Maria certamente manteve aquela característica fundamental que se observa, dizíamos uma vez, em todas as grandes obras de Deus: uma grande simplicidade exterior, unida à grandiosidade e ao esplendor da realidade interior. [...]. Como Maria era ‘por dentro’, esse é um segredo que Deus guardou só para si.” (CANTALAMESSA, 2008, p.134).

Todavia, igrejas protestantes dizem que esta verdade mariana é criação da Igreja Católica. Pode ser? Bem, a resposta poderia ser fornecida relembrando as bem-aventuranças: “Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem, quando vos perseguirem e disserem falsamente todo o mal contra vós por causa de mim. Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus, pois assim perseguiram os profetas que vieram antes de vós (Mt 5, 11s)”.
Até esta perseguição infundada leva Maria à recompensa dos céus!
O fato de não se haver um relato bíblico específico contando da assunção de Maria não significa que o dogma não tenha um fundamento bíblico, pois não pode nunca ser função de um dogma criar verdades.
Mesmo assim, onde está a luz bíblica sobre o dogma mariano da Assunção? Primeiro, na graça e no amor de Deus que residem plenamente em Maria (Lc 1, 28.45); segundo, a ressurreição de Cristo e a nossa ressurreição é o fundamento de nossa fé. Não se pode ser cristão sem crer nesta verdade: Cristo ressuscitou e nós também ressuscitaremos.
Rm 8, “(11) Se o Espírito daquele que ressuscitou Jesus dos mortos habita em vós, ele, que ressuscitou Jesus Cristo dos mortos, também dará a vida aos vossos corpos mortais, pelo seu Espírito que habita em vós.
(35) Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação? A angústia? A perseguição? A fome? A nudez? O perigo? A espada?
(36) Realmente, está escrito: Por amor de ti somos entregues à morte o dia inteiro; somos tratados como gado destinado ao matadouro [Sl 43,23]. (37) Mas, em todas essas coisas, somos mais que vencedores pela virtude daquele que nos amou."
Outro aspecto importante é que a Primeira Carta de Coríntios, ao falar sobre a ressurreição dos mortos, destaca que nem todos ressuscitarão ao mesmo tempo, mas cada qual à sua ordem, ou seja, alguns alcançaram esta graça antecipadamente.
Vejamos o trecho de 1 cor 15:
(13) Se não há ressurreição dos mortos, nem Cristo ressuscitou. (14) Se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação, e também é vã a vossa fé. (20) Mas não! Cristo ressuscitou dentre os mortos, como primícias dos que morreram!
(23) Cada qual, porém, em sua ordem: como primícias, Cristo; em seguida, os que forem de Cristo, na ocasião de sua vinda.
Por que Maria recebeu esse privilégio primeiro?
A assunção de Maria embora seja um privilégio, antes de ser excludente, ou seja, exclusivo de Maria, é um ato includente do Amor de Deus para com o ser humano e a antecipação de uma promessa, além de uma constatação de que Maria foi toda de Cristo (BOFF, 2007).
De tal modo afirmava São João Paulo II: “A assunção ao céu constitui uma grande antecipação do cumprimento definitivo de todas as coisas em Deus, conforme quanto escreve o Apóstolo: ‘depois virá o fim, quando (Cristo) entregar o Reino a Deus Pai [...] a fim de que Deus seja tudo em todos’ (1 Cor 15,24.28). Porventura, não é Deus tudo n’Aquela que é a Mãe Imaculada do Redentor?” (São João Paulo II apud Aquino, 2003, p.132)

A Constituição Dogmática – item 25 –, isto é, o documento do Papa Pio XII, que proclama o dogma da Assunção de Maria, em 1854, trás a opinião de alguns teólogos sobre nesse sentido: “A razão primária e fundamental diziam ser o amor filial de Cristo para o levar a querer a assunção de sua Mãe ao céu. E advertiam mais, que a força dos argumentos se baseava na incomparável dignidade da sua maternidade divina e em todas as graças que dela derivam: a santidade altíssima que excede a santidade de todos os homens e anjos, a íntima união de Maria com o seu Filho, e sobretudo o amor que o Filho consagrava a sua Mãe digníssima.”
Mas creio que a explicação mais simples e bela é dada por S. Francisco de Sales, cujo testemunho está no mesmo documento – item 35 –: “[...] S. Francisco de Sales afirma que não se pode duvidar que Jesus Cristo cumpriu do modo mais perfeito o divino mandamento que obriga os filhos a honrar os pais. E a seguir faz esta pergunta: «Que filho haveria, que, se pudesse, não ressuscitava a sua mãe e não a levava para o céu?»".
Convido você a continuar nesta descoberta no post 02.
Referência:
Encíclica Munificentissimus Deus do Papa Pio XII. Dispõe sobre a Constituição Apostólica pela qual foi Definido o Dogma de Nossa Senhora, em Corpo e Alma ao Céu. 01 nov 1950.
Encíclica Redemptoris Mater do Papa João Paulo II. Dispõe sobre a Bem Aventurada Virgem Maria na Vida da Igreja que está a Caminho. 25 mar 1987.
Encíclica Rosarium Virginis Mariae do Papa João Paulo II. 16 out 2002.
BOFF, Fr. Clodovis. Maria no Novo Testamento. In.: Congresso Mariano: “Contemplar Cristo com os Olhos de Maria”. João Pessoa: Arquidiocese da Paraíba, 2003.
BOFF, Fr. Clodovis. Mariologia Social: o significado da Virgem para a Sociedade. São Paulo: Paulus, 2009.
BOFF, Ir. Lina. Mariologia: interpelações para a vida e para a fé. São Paulo: Paulus, 2007.
CANTALAMESSA, Raniero. Maria: um espelho para a Igreja. São Paulo: Santuário, 2008.
KRIEGER, Dom Murilo S.R. Com Maria, a Mãe de Jesus. São Paulo: Paulinas, 2002.
LIGÓRIO, Santo Afonso. Glórias de Maria. São Paulo: Santuário, 2001.
MONTFORT, São Luís Maria Grinion de. Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem. São Paulo: Vozes, 2008.
SÉSBOÜÉ, B.; BOURGEOIS, H.; TIHON, P. Os sinais de salvação. v.03. São Paulo: Loyola, 2005.
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