OS SACRAMENTOS: sinais sensíveis
- Alan Dionizio Carneiro
- 17 de dez. de 2016
- 5 min de leitura
“Olhamos uma coisa e cremos noutra.” (S. João Crisóstomo).
“Quem foi que me tocou?” (Lc 8, 45a).
No texto anterior, viu-se que os sacramentos são atos de fé ligados à Palavra edificante e ao Testemunho de um Povo para com Deus. Descobriu-se então porque os primeiros cristãos têm necessidade de reunir-se e celebrar aquilo que depois serão chamados por sacramentos.
Surge, então, outros aspectos em torno dos sacramentos, a partir dessa: se os sacramentos são de iniciativa divina, como eles produzem seus efeitos? Onde começa sua eficácia? Os sacramentos são mágicos? Eles são simbolismos, crendices, modismos? Ou mesmo simpatias?
A resposta mais simples que podemos dar é: os ritos que chamamos sacramentos são sinais sensíveis!
Desse modo, o sacramento é primeiramente sinal, pois indica e realiza uma realidade diferente da que é percebida. Vejamos um exemplo limitado e profano: num cruzamento fechado, independente de nossa vontade, há um semáforo, isto é, um sinal. Sua luz vermelha indica uma outra realidade, “PARE”, e pelos olhos da fé, o motorista atento e conhecedor das leis de trânsito, obedece a norma, o que o faz livrar-se dos perigos de um acidente. Caso contrário, o sinal continua eficaz, pois se o motorista não o obedece, ele continuava a alertar que se houvesse confiado nele, não haveria perigo de fatalidade. O que isto tem a ver com o sacramento?
Tudo. A luz vermelha em um ambiente diferente ao do trânsito nem sempre significaria ‘pare’ nem indicaria a ordem para quem a visse, parar. Assim também, os sacramentos de forma especialíssima e superior indicam uma outra realidade que é a do Reino de Deus, sem deixar de indicar: que este Reino tem uma história anterior que o anuncia (é o que chamamos de figura); que a Palavra de Deus permanece; que seu fundamento é Cristo; a função da Igreja no mundo; a presença de Cristo Ressurreto na vida de cada pessoa; que o Reino de Deus não é deste mundo, logo o sacramento também leva a um porvir.
Os ritos dos sacramentos se baseiam em duas dimensões sensíveis: uma palavra e um gesto feito sobre o corpo (SESBOÜÉ; BOURGEOIS; TIHON, 2005). Essa compreensão pode ser percebida no texto a seguir: Ef 5, 25b.26: “Cristo amou a Igreja e se entregou por ela, para santificá-la, purificando-a pela água do batismo com a palavra”.
Deve-se destacar que os gestos contidos nos ritos não são criados como uma nova dança ou um código secreto. Eles são gestos cotidianos (lavar-se, comer, beber, ungir-se etc.) que, por causa da palavra e do contexto de oração em que o mesmo se insere, toma uma nova significação que “[...] evoca o Reino de Deus. É uma parábola em ato cujos harmônicos sugerem e atualizam o mistério evangélico. [...] o visível leva ao invisível e a figura à realidade misteriosa.” (SESBOÜÉ; BOURGEOIS; TIHON, 2005, p. 35).
O sacramento, enquanto sinal sensível, isto é, que usa elementos como sons, cores/luzes, sensações olfativas, táteis (óleo) e gostos (vinho), conduz-nos a outra realidade.
Os elementos (água, pão, vinho, sal, óleo), os gestos que o acompanham, o ministro e a assembléia eclesial são chamados de figuras no sacramento. Por que figuras? Porque evocam um sentido figurativo, representativo, que faz referência, real, mas não autêntico. No sacramento, o pão não é o trigo que se come, é o Cristo que se comunga, eis o autêntico Pão do Céu (panis angellis).
Insere-se, dentro do contexto de figura, também os acontecimentos e textos das escrituras, que na meditação se ligam ao sacramento. A água batismal faz memória ao batismo de Jesus, à água do dilúvio, à travessia do mar vermelho, à água da mulher no poço de Jacó, à água que jorrou do peito de Jesus crucificado.
Nesse sentido, a própria história do povo de Deus está contida na figura sacramental, de forma que o sacramento é um ato de memória. Nas palavras dos teólogos: “Ao atualizar o que é, lembra o que foi.” (SESBOÜÉ; BOURGEOIS; TIHON, 2005, p. 37).
Desse modo, a figura é tudo aquilo que se recorda e se transmuta, ou seja, que é levado a uma nova realidade, qual seja, a do Reino de Deus, pelo rito de um sacramento. O ministro, por exemplo, exprime a presença e a ação de Cristo, logo, é sempre Cristo quem batiza.
Compreendendo-se isto pela fé, o sacramento não apenas significa (um ato com significado), ele também realiza o que se propõe pela palavra (um ato eficaz).
Por exemplo: No rito do batismo, o sacerdote lava a cabeça do fiel consagrando-o em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Enquanto a água toca o corpo, a palavra purifica a alma e torna a pessoa uma nova criatura. Por que a palavra tem este poder? Porque ela é Deus em ação, como diz o Evangelho: “No princípio era o Verbo [a palavra], e o Verbo estava junto de Deus e o Verbo era Deus” (Jo 1,1). As palavras no rito não são apenas comentários, são atos de Deus e que pedem uma resposta: a fé de quem o recebe.
Diante de tudo isto que abordou-se, percebe-se o quão longe está o sacramento de um passe de mágica como alguém que tira coelhos de cartolas, ou mesmo, de simpatias de folclore. Afinal, após a consagração na missa, meus olhos continuam vendo pão, para eles nada mudou, mas meu coração canta “amém” e comunga o corpo de Cristo. O pão não simboliza Cristo, é a própria pessoa de Cristo.
Deve-se refletir mais sobre os sinais sacramentais, pois muitos comungam do pão do altar COMO se fosse o corpo de Cristo, mas não consideram que se alimentam, ou comem verdadeiramente o Corpo de Cristo. Isto, além de um erro grave na caminhada cristã, é um perigo para o Católico, pois celebrar um sacramento não é fazer festinha social ou brincar de teatrinho.
Jo 6, 53. 55s: Então Jesus lhes disse: Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne do Filho do Homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós mesmos. [...]. Pois a minha carne é verdadeiramente uma comida e o meu sangue, verdadeiramente uma bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele.
Retomando, então, o testemunho dos primeiros cristãos em torno dos sacramentos, termino o texto dessa semana firmando que os sacramentos são sinais sensíveis e eficazes da graça de Deus, no qual o ver convoca o crer.
O sacramento não é sensível apenas pelo elemento que se sente, mas também por aquilo que ele faz o coração sentir. “O sacramento, então, faz ato de passagem. Orienta a fé para uma alteridade, a do mistério.” (SESBOÜÉ; BOURGEOIS; TIHON, 2005, p. 35).
Como pode ser isso? Como a graça de Deus age através do sacramento confiado à Igreja?
Responderei de forma objetiva, como se dá em toda Celebração Eucarística:
Tudo isto é mistério da fé!
Referências:
SESBOÜÉ, B.; BOURGEOIS, H.; TIHON, P. História dos dogmas: Os sinais da salvação. v.3. São Paulo: Loyola, 2005.
VATICANO. Catecismo da Igreja Católica. São Paulo: Loyola, 2000.
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